Revista da TV - 06/01/1985 |
"Quem não faria um pacto com o diabo tão bonito e envolvente? Eu mandaria ele vir cá pra casa..." A brincadeira é de Elaine Cristina, a mulher do "diabo" Flávio Galvão. No apartamento novo em São Conrado, para onde se mudou há menos de um mês, o ator constrói seu personagem de "Corpo a Corpo" com gestos, olhares e mistério, pois ele mesmo não sabe quem é esse homem, que dizem ser o demônio.
O que menos interessa a Flávio Galvão nesse trabalho é o futuro do personagem:
- A novela é uma obra aberta e a partir daí não dá para viver pensando no futuro. Agora, faço um homem misterioso e eu vivo isso enquanto trabalho com um texto que me dá um leque de opções, porque Gilberrto Braga não faz de seus personagens um bloco monolítico. Ele dá humanidade, mostra que ninguém é só bom nem só mau. E o grande lance é mostrar todos os lados. É bom para o público e dá prazer ao ator. Importante também é que o meu personagem aparece pouco, sempre na hora certa, dentro de um clima.
- Como já disse Sartre, o diabo são os outros. Meu personagem nunca disse que é o diabo. Esta é uma conclusão dos outros. Só sei que tenho sido alvo de olhares de admiração e nunca de ódio, raiva ou medo. Até a torcida do América está querendo convocar meu personagem para dar sorte ao time.
- Eu me sinto como a pŕopria Madame Satã. Afinal, sou a mulher do diabo. Percebo que as mulheres sentem fascinação pelo personagem e olham para o Flávio com fascinação também. Flavito, nosso filho, também está curtindo numa boa essa história toda. Ele está com 9 anos, sempre acompanhou nosso trabalho em teatro e televisão, conhece o mundo da fantasia e anda dizendo que é o capetinha.
Ator de formação teatral, Flávio sente prazer em raciocinar em função do personagem, estudar as sutilezas mais profundas, experimentar gesto, olhares, um jeito de falar mansamente e mostrar que a crueldade não está no ato de falar alto ou gritar:
- Não tenho memória visual nem auditiva, não decoro textos. Eu estudo, compreendo. Faço um trabalho sedimentado no teatro, o exercício de ir até o fundo, ganhar em profundidade e depois ganhar na surperfície. Ser simples, não representar.
Apaixonado pela profissão, ele se interessa por projetos, se entrega sem se preocupar com mais nada. Sabe que o dinheiro vem como inevitável forma de retribuição pela dedicação de fazer o que gosta. Em São Paul, dirigi telecontos e teleromances na TV Cultura, mas sente maior prazer em trabalhar como ator:
- A gente tem que se interessar por aquilo que é um sonho. Meu sonho é fazer um personagem e o retorno é o crescimento como ser humano. Como ator e empresário de teatro, aprendi a lidar com os grandes sucessos e os grandes fracassos. O sucesso é importante, amacia o ego, mas é efêmero. Com o fracasso, a gente aprende mais.
E como premiado ator de teatro, Flávio Galvão não se importa de ser descoberto pelo publico a partir do momento em que faz uma novela numa grande emissora de televisão:
- Não me incomodaria nem se recebesse um prêmio como ator revelação. A TV é o mais importante veículo de comunicação. Enquanto levo 100 mil pessoas ao teatro numa temporada de seis meses, entro toda noite na casa de milhões de pessoas. E através da televisão o artista pode levar o público ao teatro, porque a verdade é que há idolatria e as pessoas gostam de ver seus ídolos de perto, no palco.
Ainda em ritmo de mudança e adaptação, Flávio faz questão de ajudar a mulher em casa. Diz que ela tem mania de organização e que é incansável no trabalho caseiro. Elaine confirma:
- Realmente, não descanso enquanto não vejo tudo arrumado. Estou numa fase em que a casa e a famĺia me solicitam muito e, mesmo sabendo conciliar meu trabalho de atriz com os afazeres domésticos, estou fora do ar desde que terminei de fazer a novela "O Anjo Maldito", na TVS, há nove meses. Mas logo, logo, eu volto.
Revista da TV - 06/01/1985 |
Nenhum comentário:
Postar um comentário